domingo, 27 de novembro de 2016

Sonho

A noite esta fria e desértica, ninguém nas ruas, céu com poucas estrelas e um tímido Luar. A rua cinza e calada, em sua esquina uma boneca lamenta o seu cruel destino. Seus membros foram arrancados, só resta seu tronco com a cabeça, amarrados com arame farpado em torno de uma cruz de madeira, enfincada em um buraco no meio da calçada. Garrafas de pinga e o que parece ser um sapo morto estão ao seu redor, lhe fazendo companhia. Me aproximo, imagino uma criança feliz brincando com a boneca, mas logo minha imaginação é tomada pela obscuridade daquela cena a minha frente.
Demônios com asas, magros a ponto de os ossos se destacar dentre a carne que aparenta estar podre, cheiro de enxofre no ar. Aranhas gigantes tomam conta da rua, surgem das sombras, dos bueiros e rapidamente me cercam, impedindo que eu fuja sem ter que encarar ao menos uma dezena delas. Posso ouvir uma música emergido no ar, como uma maldição preste a entrar em seu ápice, Kathaarian Life Cod é entoada como se estivesse na porta do inferno, sendo chamado para queimar eternamente ao lado de Satan.
Uma das aranhas vem em minha direção, esta é maior e terrivelmente mais horrível que todas as outras. No centro de seu corpo está uma cabeça de boneca, com os fios de cabelos arrancados, olhos furados, e em sua testa uma suástica torta e mal feita pode ser vista. A boca da cabeça de boneca se abre, palavras saem em forma de gritos, ecoando por aquela rua deserta, sangue vem em seguida, e logo a proporção daquilo se aumenta, as aranhas vem em minha direção, grunhidos de almas gritando do mais profundo inferno, sou apenas um amontoado de carne sendo devorado por malditas aranhas. Não consigo correr e nem gritar, fecho meus olhos e estou na mais profunda escuridão.

Acordo assustado, estou deitado em minha cama, não consigo me mexer, nem ao menos abrir a boca, aquela sensação horrível de acordar de um pesadelo a noite e ter que esperar esse efeito passar. Me recomponho e logo os movimentos voltam ao meu corpo. Me levanto e vou até o banheiro, me olho no espelho e debruço meu rosto na pia, deixando a agua gelada correr sobre minhas olheiras descendo até minha barba, volto a me olhar no espelho. Tem algo no meu lábio, me aproximo do espelho, abro a minha boca para ver com melhor facilidade, uma aranha sai de dentro da minha boca, fico pasmo e mal posso acreditar que isto está acontecendo. Minha garganta começa a arder e logo não consigo mais me controlar, sinto meu corpo queimando de dentro pra fora, me viro contra a parede do banheiro, e bato minha cabeça contra o azulejo com a maior força que poderia ter em um momento como esses. O branco do banheiro logo é tomado pelo vermelho do meu sangue, meu corpo cai sobre a poça de sangue e a consciência não mais me pertence. Sou apenas um corpo gelado que recebera a autóptica de suicídio.

Ilusão

Você esta preso em um caminho sem volta, sozinho, na mais profunda escuridão, sem ter para onde correr. Esta ouvindo estes gritos? São os milhares de mortos, que assim como eu e você morreram sem ter feito merda nenhuma na vida. Mas o que quer que eu faça? O mundo é um grande aglomerado de primatas, cegos pela ignorância. Por mais que você tente ser diferente, se destacar de alguma maneira, o final já é certo, o esquecimento nos aguarda, e isso parece tão terrível e ao mesmo tempo gentil.
Grito, corro, e procuro pela verdade em cada esquina, mas no fundo eu sei, o maldito coelho branco é apenas uma ilusão, assim como a igreja, a política, as marcas e todo o resto que nos cercam. Uma prisão construída por nós, para nós mesmos.
Procuro por alguém que pensa da forma que eu penso, e a única coisa que encontro são rastros deixados por alguém que já passou pela mesma situação que eu. Sou como o narrador de Clube da luta, indo em cidade à cidade procurando por mim mesmo. E nada, pode me ajudar, nem mesmo alucinações causadas pelas drogas, nem a sensação de embriagues, muito menos o cigarro. Este é um caminho que se trilha sozinho, em busca do oculto, do desconhecido, daquilo que um dia já te deu medo, mas que hoje você clama por sua companhia.
Eu quero que você saiba que eu estive aqui, que eu trilhei este caminho, e talvez estive mais perdido do que você possa imaginar. Me dê a sua mão, vamos juntos, eu e você, andarmos de mãos dadas por ruas vazias de madrugada, olhar para cada casa e imaginar o que acontece ali dentro, pensar se estamos sozinhos, se tem alguém passando pela mesma situação que nós.
Gostaria de acreditar que um dia tudo isso vai passar, e que eu não vou ter mais medo de viver, ou sobreviver, mas ao mesmo tempo penso, Que merda é viver? Dormir acreditando que no dia seguinte todas as minhas dúvidas serão sanadas? Acreditar que um dia posso encontrar alguém que faça com que minha vida faça sentido? Ou vou acabar reproduzindo igual a coelhos e este será o tão aclamado significado da minha vida? Ser escravo dos hormônios do meu corpo?
Estou ouvindo “Burzum - Beholding The Daughters Of The Firmament”, e por um momento é o que mais fez sentido na minha semana, no meu mês, talvez nos meus últimos 20 anos. Fecho os olhos e penso na conturbada vida que o homem por trás dessa música teve, e tem, e por um momento gostaria de ter esta vida para mim, talvez assim teria um objetivo maior do que escrever em um computador, sentado em uma cama.
Não precisamos queimar igrejas, nem matarmos uns aos outros, isso não leva a nada, apenas cria ódio e dissemina a intolerância. O que eu preciso neste momento é alguém que me explique o porquê de tudo isso.

E assim mais uma noite corre de minhas mãos, passando dentre meus dedos, como a areia de uma praia.